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Qualis Editora

Trecho de Destinos Cruzados - Mirela Paes



Era hora de virar a página. Ano novo, vida nova. Novos desafios, menos nervosismo, saber me impor mais, não me sentir culpada porque meu namoro não dava certo... A banheira ainda estava com vestígios da tintura, mas agora eu precisava terminar de me maquiar. Assim que peguei o lápis de olho, reparei bem. O tonalizante havia feito uma enorme diferença.E o choque da minha mãe quando me viu? Olhando no espelho, entendia a reação dela. Depois de anos fazendo mechas claras no meu cabelo, pintá-lo de castanho escuro havia me mudado totalmente. Fiquei mais pálida do que já era. Será que foi mesmo uma boa decisão? Estava precisando de uma mudança drástica. Não me lembrar dos dias em Palm Beach já seria um começo. Só de pensar naquela loucura toda, sinto um frio estranho tomando conta da minha barriga, ao mesmo tempo que minhas bochechas mais parecem pegar fogo. Maldição! Não deveria me sentir culpada. O que aconteceu não foi nada demais. Não fiz nada de errado. Bem, nada gravemente errado... — Ano novo, vida nova! — resmungo para mim mesma. — Vida nova...

Apoiada na pia do banheiro, me observei mais uma vez no espelho. Se nada desse certo, ao menos uma mudança teria ocorrido. Meu cabelo estava escuro demais. Algo totalmente diferente, uma vez que durante toda a minha vida ele sempre foi muito claro. — Sarah, você não vai me dar um abraço antes do ano novo? A voz do meu irmão do outro lado da porta me tranquilizou. Estava certa de que ele me arrastaria para sair com ele e sua namorada chata após a virada. Só por isso, estava tentando me arrumar mais do que o habitual.

— Já vou! — berrei enquanto tentava encontrar as minhas botas favoritas pelo quarto.

— Você já disse isso para a mamãe duas vezes! Ri enquanto terminava de calçar as botas. Coloquei o celular no bolso do vestido e destranquei a porta do quarto. Hugo franziu a testa e me deu um sorriso torto. Eu tinha certeza de que ele estava tentando não fazer uma pergunta grosseira. — É por isso que mamãe falou que você voltou diferente? — Fiz uma careta e fechei a porta atrás de mim. — Você passa três dias na Flórida e volta igual à uma gótica? Eu ri. Alto. Bem alto.

— Foi ela quem me deu esse vestido preto para passar o ano novo. Tradição é tradição. — Cruzei os braços. — Preferia mesmo era passar o ano novo de pijama, mas você resolveu trazer sua namorada... Ele apenas balançou a cabeça negativamente e pegou minha mão. Me fez dar uma voltinha, e assim que pude observá-lo novamente, percebi a sua óbvia desaprovação. — Você está usando essas botas, meia, maquiagem, e o seu cabelo está igual ao da Mortícia Addams. — Oh! — Coloquei minhas mãos sobre o peito fingindo estar ofendida. — Assim você me magoa. — Sério S. Está me assustando. Não pude segurar o riso. Não conseguia ficar com raiva do meu irmão mais velho, e tinha certeza de que se aquela fosse sua sexta ou sétima cerveja, estaria sendo bem mais cruel nos comentários. Deu mais um gole preguiçoso e me olhou com calma. Precisava enforcar Mandy por isso. Em uma cidade enorme como Los Angeles ele tinha mesmo que se apaixonar por uma futura psiquiatra?

— Quando você vai parar de me analisar? — perguntei, pegando a cerveja da sua mão. Ele gargalhou e balançou a cabeça.

— Estou tentando entender... — Fez gestos estranhos com as mãos, como se quisesse ao mesmo tempo apontar para minha cabeça e para minhas roupas. — Você e o James... quero dizer, isso seria... — Ele parecia querer encontrar palavras. — Isso é um tipo de manifestação de luto? Pensei que você e o James só tinham brigado, não acabado. Não queria falar sobre isso.

Luto? Pude sentir uma leve dor de cabeça, só de compreender a gravidade da pergunta. Seu óbvio exagero só demonstrava como era a realidade do meu relacionamento com James. Mais dos outros do que realmente meu. Eu não estava de luto, mas confusa.

Evitei pensar nisso durante os últimos dias. E estava decidida em continuar com as coisas dessa forma.

— Que tal eu te mostrar uns desenhos novos?

Ele pareceu concordar comigo, então me aproveitei da situação, determinada em fazê-lo se calar.

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